Gritei de susto encarando a gosma esverdeada que pingava do envelope a minha frente. Porque raios a pessoa que me pariu se daria ao trabalho pra fazer uma trocidade dessas? Ah é mesmo porque eu fugi de um casamento arranjado contra minha vontade e eles não aceitavam. Revirei os olhos sufocando o choro encarando a palma da mão esquerda machucada, furunculos, sério? Pus de bubotúbera que coisa mais infantil! Bufei pegando um pano que usava para limpar as prateleiras e ainda estava limpo para limpar a mão, evitando que piorasse. Devia ter queimado a carta depois daquela palhaçada? Devia mas como deve ter idiota escrito na minha testa resolvi ler a mesma enquanto juntava os livros do balcão que foram devolvidos. Me culpar pela desgraça da familia era aceitável, mas me culpar pelo fato da vovó quase ter infartado era maldade, ela era velha e eu não vou casar com alguém velho porque ela quer, só ela se casar com ele simples! A resposta debochada para cada linha da carta brilhava em minha mente na mesma velocidade que eu lia, com os livros equilibrados nos braços, a primeira parada seria a sessão de feitiços, ali começou a colocar os livros no lugar, principalmente os que as crianças tiravam do lugar para consultar e não sabiam onde guardar novamente, ficava agradecida por deixarem sobre a mesa e não num lugar errado. Encarei um bilhetinho suspeito na estante e não contive um riso quando li algo sobre beijos entre as estantes, talvez eu devesse vigiar mais essas estantes no decorrer do dia, meu emprego dependia disso, esse povo que quer ficar de pegação na biblioteca... Eu hein!

Sacudi a cabeça voltando a ler a carta maldita. Blá, blá,blá filha ingrata, ser deserdada, tá nada fora do normal. Adentrei a área de DCAT guardando alguns volumes pesados sentindo as brotoejas na palma da mão doerem como o inferno, como se não bastasse isso tinha a maldita coruja, o bater incessante no vidro da biblioteca só não era tão irritante quanto o gotejar de uma torneira no meio da noite. Encarei a ave negra pelo vidro e quase fiz dedo pra ela, mas Hórus não tinha culpa de ser a coruja dos meus pais. Deixei os livros de herbologia por ultimo e voltei para minha mesa, peguei pergaminho e uma pena, afundando-a no tinteiro e corri sobre o papel escrevendo com fúria, mas no fundo aquilo doía. As palavras foram poucas e certeiras: "A filha renegada pede por gentileza que esqueçam de sua existência, p.s.: Não vou devolver o favor porque minha mão está em uma situação delicada, muito obrigada mamãe." Enrolei o papel engolindo o nó na garganta a maldita vontade de chorar e abri um pouco o vidro da janela, acariciei as penas da coruja e assim que terminei de amarrar o bilhete em sua pata a vi se perder na noite.

Sacudi a cabeça negativamente observando minha mão, doía como o inferno, mas era um machucado feio. Precisava cuidar disso, mas tinha que terminar as coisas na biblioteca. Retomei a organização dos livros nas prateleiras, procurando pelos livros de herbologia como cuidar daquilo, não queria ir na enfermaria encher o saco de ninguém e muito menos no mungus. Revirou os olhos guardando os últimos exemplares em seus lugares e puxou a varinha, num movimento simples já conhecido conjurou alguns espanadores e panos para limpar a poeira das estantes. Seu trabalho ali estava feito, agora precisava cuidar da mão. -Valeu mamãe, vou sempre lembrar do seu presente! Vaca!- Sussurrei pro escuro enquanto deixava a biblioteca emburrada com as coisas que haviam acontecido.

Estava sentada despretensiosa na minha mesa, terminando de atualizar algumas fichas quando ouvi uns barulhos suspeitos na seção de herbologia, levantei pé ante pé e suspirei, se fosse outro casalzinho se agarrando eu ia ter um faniquito, juro, gente existem sete andares nesse castelo, várias torres, terrenos a perder de vista e o povo só sabe beijar na biblioteca? Encarei os enfeites natalinos pelas estantes altas e suspirei, caminhei passando por mais duas estantes e parei encarando o casal ali, a garota loira olhava para o chão como se nada tivesse acontecido e o rapaz moreno puxou o casaco sobre os cabelos escorridos, mas eu conhecia as figurinhas carimbadas.

Hildegard parecia extremamente sem graça por ter sido pega, já Donald, bem, o rapaz tinha no rosto um sorriso vitorioso, como se aquela fosse a real intenção dele, fazer-se ser notado, cruzei os braços encarando o sonserino e a corvina e sussurrei empurrando o óculos de aro redondo sobre o nariz: -Vocês dois, de novo? Odinson e Vermont, é meu ultimo aviso pros dois, não me façam chamar Magni ou qualquer outro adulto responsável pra uma conversa séria! Não quero saber o que vocês estavam fazendo, mas não façam mais na biblioteca, por favor. Agora saiam daqui.- Observei a loira puxar o rapaz pela mão enquanto saia correndo da biblioteca. Revirei os olhos sacudindo a cabeça negativamente enquanto caminhava até uma das janelas vendo luz na cabana do guarda-caças. Será que Okan ainda estava acordado para uma xícara de chá? Ri comigo mesma sacudindo a cabeça negativamente, sempre que a gente se encontrava era pra tomar chá, eu ia fazer o homem odiar chá até o fim do ano letivo. Deixava a biblioteca depois de uma ultima ronda pelos corredores saindo do castelo.